quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Uma breve, nada completa, história dos jogos independentes, parte I: Os primeiros anos

Jogo feito por equipes pequenas e sem financiamento dos grandes distribuidores. Artístico. Inovador. Ousado. Independente, ué. Todas essas são possíveis definições para "indie game", ou representam a percepção dos jogadores contemporâneos sobre o tema. De fato, a divisão da indústria de jogos entre as grandes corporações e os desenvolvedores indie se tornou um dos temas recorrentes da sétima geração, quando, graças a iniciativas de distribuição digital como o Steam, os indies ganharam um espaço até então inédito e um maior respeito e representação no mercado.

Porém, esse caminho nem sempre foi tão simples. Jogos indie tiveram que lutar por décadas por um pouco de espaço e representação, e durante esse processo mudaram muitas coisas que antes eram consideradas normas consagradas. Um olhar histórico revela a importância que os indies tiveram na indústria ao longo dos anos e diz muito a respeito de seu papel no cenário de jogos atual. Pensando nisso, dou início a essa série de três posts (spoiler: tematicamente divididos em passado, presente e futuro, com muitas liberdades) onde faço uma descrição não exatamente detalhada, porém importante, da cronologia dos jogos indie e seu impacto no mundo dos video games. Para começar, a nada fácil vida antes do advento da distribuição digital como prática consagrada de mercado.

Commander Keen (1991), da então novata Id Software

Nas décadas de 1980 e 1990. estar vinculado a alguma das "todas-poderosas" do período era o caminho mais rápido para o lançamento do seu jogo. Ter a benção de um nome como Nintendo, Sega, Square, Enix, Capcom ou Konami era o maior privilégio que um desenvolvedor poderia almejar então - e um luxo, igualmente, pois, ainda na sombra do crash de 1983, as grandes empresas não estavam interessadas em correr riscos e eram seletivas em suas parcerias. Ainda assim, ao longo dos anos pequenos desenvolvedores encontraram meios de contornar um mercado fechado para eles e encontrar seu público.

Criar jogos para computador foi a principal estratégia utilizada pelos desenvolvedores indie para lidar com a dificuldade em encontrar espaço no mercado de varejo de consoles, uma tendência que se mantém até hoje, graças às facilidades que a distribuição digital oferece. Na década de 1990, proliferaram os jogos shareware, Oferecer uma demo que o jogador pudesse experimentar antes de comprar o jogo, investir na comunicação boca a boca e no arquivo passado de amigo para amigo (por disquete - achei justo oferecer a pílula de nostalgia diária nesta observação) se mostrou uma excelente forma de popularizar o trabalho e o nome dos pequenos desenvolvedores.

Sim, houve uma época em que atirar em demônios era super underground.

Pode parecer difícil de acreditar hoje, mas a Id Software, a empresa que criou Wolfenstein 3D e Doom, clássicos da época, já foi um dia uma empresa bem pequena que se utilizava do shareware para divulgar seus jogos. FPS atualmente pode ser um sinônimo de falta de criatividade, de modo geral, nos chamados jogos AAA, mas foi uma revolução no tempo de sua criação, algo nunca antes visto e que se transformou em um sucesso instantâneo - e que melhor meio de um indie se posicionar do que criando uma revolução nas convenções do momento?

No final da década de 1990, iniciativas como o Independent Game Festival ajudaram a popularizar os jogos indie e abrir novos espaços e possibilidades na indústria. Softwares para edição de jogos também se tornaram famosos no período, como o RPG Maker e o GameMaker, oferecendo ferramentas a pequenos desenvolvedores sem experiência com as engines tradicionais.

Versão 2000 do RPG Maker (sim, esse é o tempo batendo à porta...)

Na primeira metade dos anos 2000, durante a sexta geração de consoles, o mercado de video games viu a ascensão de uma vertente dentro dos jogos indie que fugia completamente dos padrões da época: os chamados art games, jogos com uma veia artística que não se prendiam às convenções de jogabilidade e narrativa, colocando arte e estética acima do entretenimento. Destacam-se, nesse gênero, Samorost, da Amanita Design, e The Endless Forest, da Tale of Tales, duas desenvolvedoras indie bastante ativas até hoje (como mostrarei no próximo post desta série). Desse período também são dignos de nota Syberia, um influente point and click da Microïds, e Gish, jogo de plataforma/estratégia que teve no seu time de designers Edmund McMillen (outro nome que será bastante mencionado no próximo post...).

Samorost, da Amanita Design

Mudanças estavam começando a surgir no mercado de jogos indie, mas o terreno ainda era bastante arenoso para os pequenos desenvolvedores. Dificuldades de distribuição eram a norma, preconceito e desconhecimento eram recorrentes e a indústria de modo geral continuava girando quase que exclusivamente ao redor das grandes empresas. A principal mudança, porém, ainda estava por vir, pois a Valve mudaria o cenário de toda a indústria com o Steam, oferecendo uma chance a toda uma geração de game designers talentosos e possibilitando a ascensão dos jogos indie como uma força a ser reconhecida.

Isso, porém, é toda uma nova história, que eu contarei em detalhes no próximo post desta série. Até lá!

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